EMA LEMOS (1932-2022)
Só há pouco tempo soube do falecimento de D. Ema Lemos, cujo desaparecimento empobreceu sobremaneira os Açores. A tecelagem tradicional e não só, perdeu uma das mais notáveis Artistas da Região.
Conhecia-a no dia 24 de novembro de 1989, durante a cerimónia de inauguração da 1ª Exposição da Artista, feita a convite da então Directora da Casa da Cultura de Angra, Doutora Maria Antonieta Mendes do Couto Costa, na Galeria da DRAC-SREC, na altura localizada na rua da Sé.
Ema Silveira de Lemos nasceu a 7 de novembro de 1932 na Vila das Velas, ilha de S. Jorge, onde aos catorze anos se profissionalizou em tecelagem das famosas colchas de tear, da sua ilha. Veio, jovem, residir em 1952 para a Terceira, Ribeirinha, Ladeira Grande nº 5, sendo que aí casou a 5 de Julho de 1952 com Francisco Machado Vitória. Morreu aos 89 anos a 11 de fevereiro de 2022, após quase setenta anos de vivencia na Ribeirinha, concelho d’Angra do Heroísmo.
Antonieta Costa no folheto alusivo a essa Exposição escreveu: “durante toda a sua vida fez tecelagem pelos padrões tradicionais. Há oito anos decidiu (sem qualquer preparação) começar a improvisar os seus próprios desenhos. O sucesso que a figuração do quotidiano, visto pelos seus olhos e tecido pelas suas mãos, obteve logo à partida, animou-a a continuar. Saíu, expôs em feiras pelos Açores e sobretudo no Continente Português. Os seus trabalhos partiram para todo o mundo. Mormente América, Brasil, Canadá, França, Alemanha, eram os seus destinos. Recebe encomendas específicas: esta casa, aquele barco… As dimensões não variam muito: de 30cm x 40 cm até 75 cm x 90 cm. As cores usuais – o azul forte, o verde, o rosa, modelam casas, impérios, touradas, barcos.
Quer pesquisar o passado para melhor o ligar ao futuro. Entrelaçados nos fios do tear velhinho, saindo das raízes da tecelagem, surgem as novas técnicas a transfigurar o antigo-moderno, a cultura que se renova.”
Antonieta Costa salienta ainda: “Nas artes da tecelagem a ilha Terceira tem manifestado uma vontade clara e definida de progresso, neste caso libertação em direcção a formas individualizadas de expressão. Os artistas anteriormente presos a processos ainda ligados aos modelos tradicionais (das populares colchas ou mantas), improvisam sobre os liços e a teia, formas, padrões e usos novos.”
D. Ema frequentou com bom aproveitamento alguns dos cursos promovidos pela Casa da Cultura, ministrados por Tristão Freire de Andrade.
O Autor destas linhas ao ter consciência do valor de D. Ema Lemos, pela observação das suas obras, e estando ligado ao Sector Cultural do Município Angrense, sugeriu-lhe, com a anuência e apoio do então Presidente Dr. Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte, uma nova exposição a ter lugar durante as Festas Sanjoaninas/91, no hall superior dos Paços do Concelho, sob o título “Tecelagem Tradicional (Outra Abordagem), solicitando a preciosa colaboração do artista plástico Tristão Manuel Ferreira Freire de Andrade (1945-2011), antigo funcionário da DRAC e depois do Museu d’Angra, que montou a 2ª Exposição com 13 Quadros”, e no Folheto/Catálogo inerente afirma: “Quando falamos de artesanato, algumas opiniões redutoras e mercantilistas apontam para um produto de qualidade duvidosa, feito à mão, supostamente portador de uma tradição localizada em épocas discutíveis, de um passado qualquer. Não concordo! Foi o artesão que justificou, pela qualidade do seu trabalho e pela evolução permanente do seu produto, a própria revolução industrial. Temos hoje rótulos para tudo: temos designers, temos técnicos, temos artistas, temos criativos. O artesão, na verdadeira acepção da palavra é tudo isso, e é ainda portador da tradição do bem feito à mão. A sra. D. Ema, que muito admiro, é mais do que isso: É uma verdadeira Artista Popular. Com a ingenuidade, aplicada aqui como tradução livre de naiveté, é capaz de fazer evoluir, no melhor sentido, o óptimo do nosso verdadeiro artesanato.”
Os trabalhos, ou seja a obra de D. Ema Lemos sempre mereceu o maior apreço de todos os amantes do belo, onde se conjugam duma forma impressionante bom gosto e uma extraordinária harmonia, desde as próprias cores vivas que imprime sobretudo nos Impérios…
Tive o privilégio dela me oferecer honrosamente um dos seus Impérios, que mandei emoldurar com o maior gosto e respeito. Ela não costumava assinar os trabalhos, tendo-lhe sugerido que o passasse a fazer, como marca autoral, mesmo que fosse só EMA e o ano de produção, tendo constatado que fez isso, pelo menos nalguns deles.
Aqui fica esta modesta homenagem e recordação, mais que merecida.
Que descanse em paz.
Casa da Quinta da Estrela, Angra do Heroísmo, 1º Dez. 2022
Fotos: Colecção. J.B.B.
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