O SABER, O FAZER E O QUERER
Texto: Maduro-Dias
A questão das pedrinhas do chão fizeram-me olhar por aí, a ver o que havia de recente e de antigo, nesta matéria, e lembraram-me outros lugares onde a calçada à portuguesa fez escola e estilo.
Algumas publicações recentes, como o Manual de Calçada à Portuguesa da Direcção Geral de Energia e Geologia – 2009, consultável na internet em português e inglês, são muito bem conseguidos e bonitos, procurando sistematizar os métodos conhecidos e arrumar ideias acerca do assunto.
Consolidam, principalmente, o conceito, em termos de projecção internacional do também chamado “mosaico português”.
O que não deixa de ser interessante é o modo como, devagarinho, nas imagens que andam pelo espaço virtual, se percebe o passar dos tempos e o evoluir, nem sempre no bom sentido, das técnicas e modos.
Porém, não é preciso ir tão longe. No espaço que medeia entre as duas escolas secundárias de Angra podem ver-se os exemplos suficientes para formar opinião!
Deixemos de lado o modelo, tão falado, da Praça Velha, e comecemos pela praça Almeida Garrett, feita nos anos sessenta do século XX, em frente à Escola Jerónimo Emiliano de Andrade; subamos os passeios da Rua da Sé, olhemos o que resta da praceta em frente à Silveira e sigamos a caminho da Escola Tomás de Borba.
Seguindo essa rota a gente vê o que resta do bem assente empedrado do centro da Praça em frente ao tribunal, bem melhor que o outro, executado há poucos anos mesmo em frente à escola, que levantou quase todo quando uma viatura da tropa lá esteve em demonstrações (não por culpa da viatura mas por culpa do assentamento que nem aguentava um carrinho de linhas quanto mais um pesado…).
No que resta do empedrado miúdo, em frente ao Hotel Caracol, executado pelos calceteiros das Obras Públicas da então existente Junta Geral do Distrito, voltamos a ver as mesmas pedrinhas, bem juntas, encostadas, calcadas e apertadas.
Chegando à Escola Tomás de Borba percebe-se que algo mudou!
Não foi a intenção de ilustrar e decorar a preceito, que essa lá está, no extenso empedrado exterior e, até, no átrio interior!
O que mudou foram os métodos e o modo!
Os mesmos erros que, hoje, pululam por aí, debaixo dos nossos olhos e para mal dos nossos pés, estão lá bem presentes.
A toda a volta da araucária, enorme, que marca o centro da praça principal, as pedras estão dispostas de modo semi-encostado, deixando frinchas entre elas às vezes maiores que o dedo mindinho de uma pessoa qualquer.
No interior do átrio, ao modo de várias estações e centros comerciais lisboetas, a “ideia” da calçada portuguesa também foi usada para decorar…
Só que o que lá está nem sequer é calçada de faz de conta! É um assentar de pedras mais ou menos decorativo, com enormes espaços entre elas, preenchidos com argamassa de cimento, colorida a negro.
O que vale é que o trabalho foi terminado e alisado à custa de poderosas máquinas de lixar e polir. Ao menos não magoa os pés mas, de calçada portuguesa, ficou só a “ideia”!
Três quilómetros mal medidos bastam, assim, em Angra e aos olhos de qualquer um, para se perceber que, entre 1930 e 2008, o caminho percorrido parece ser o do esquecimento, pontuado, aqui e além por mostras de qualidade.
Ou bem se quer e se faz, ou bem que não!
Numa terra a caminho de fazer trinta anos na lista da UNESCO há que agarrar o leme e apontar a proa ao bom caminho, devolvendo o brilho à “escola angrense de calceteiros”.
Post Scriptum:
Podia ter alargado o comentário à ilha e referido, por exemplo, o antigo empedrado da Praça Francisco Ornelas da Câmara e os troços que dele restam, mas uma cidade do património mundial exige especiais responsabilidades, não apenas da autarquia mas de todos os níveis de governação.
No “Vela de Estai”, Diário Insular de 29 de Abril de 2012