terça-feira, 18 de julho de 2017

COMENTÁRIOS ACERCA DOS BISCOITOS DO ECO-MUSEU E DO FUTURO…

Dr. Francisco Maduro-Dias - Museu do Vinho dos Biscoitos da Casa Agrícola Brum. 
 25.ª Festa da Vinha e do Vinho - Setembro de  2016 . Ilha Terceira / Açores

Agradecendo a oportunidade e o convite para uma palestra, mais até em jeito de conversa, por ocasião da festa do vinho e da vinha dos Biscoitos, neste início de Setembro de 2016, deixo aqui algumas das ideias que mais me preocupam, no que respeita ao tema em título, sem esquecer que aqui estou, também, na qualidade de Grão-mestre da Confraria do Vinho Verdelho dos Biscoitos.

1. Os Biscoitos atravessam, desde há décadas, uma fase de expansão urbana. 
Como lugar de um clima especial e com a particularidade de permitir, a quem lá vive, ter uma sensação diária de viver “em férias”, foram e têm sido muitos os que construíram uma segunda casa, que acabou por ser a primeira.
De facto, os Biscoitos da Terceira ficam “do lado de lá”, querendo eu dizer com isto que ficam longe e fora do dia a dia de trabalho, com um sol-pôr “ao contrário” de quem mora em Angra e mesmo algo diferente de quem mora ou trabalha na Praia. Chegar aqui, todos os dias, depois de ter estado nesses outros lugares, é, realmente, poder “mudar de ares”, e isso é bom.
Isso e o clima fizeram com que muitos decidissem trocar as vinhas e as curraletas abandonadas por uma “adega”, nem que ela tenha uns bastos e avantajados metros quadrados de área coberta.
Por outro lado, muitos acham por bem que a vinha exista, desde que seja nas curraletas ao lado, e, enquanto houver vinho nos supermercados e lojas ou noutras ilhas, tem sido difícil manter uma área útil capaz para o Verdelho e, já agora, o Arinto, o Terrantez e outros, de que o campo ampelográfico do Museu do Vinho, da Casa Agrícola Brum, é testemunho e testemunha.
Enfim, como muitas coisas na vida, nada se faz sem trabalho e os resultados começam, embora Ainda ténues, a aparecer.
A seguir temos a questão da área, onde se pode dizer que existe perto de 70% de espaço ainda disponível para expansão. Depois, a lição do vizinho Pico, onde parece que o negócio começa a mostrar alguns frutos, esperando-se que, aqui nos Biscoitos, o caminho seja semelhante. Finalmente a própria qualidade climática desta zona da ilha, antigamente famosa também pela fruta, além do vinho.

2. Passando adiante vamos pensar no que a memória pode ajudar quando se fala nestas coisas do turismo, da economia sustentável, da qualidade dos bens produzidos, do futuro dos lugares e comunidades.
Falar em memória é falar de museus, de centros de interpretação, de eco-museus, de colecções visitáveis, de bibliotecas.
Ora os Biscoitos têm, desde há décadas, um eco-museu, o que é, muito provavelmente, o tipo de espaço cultural que melhor lhe podia acontecer e mais apertadamente lhe cabe, no que diz respeito a estas coisas do vinho, da vinha e da paisagem.
Diria mesmo que é, dos que conheço, o que mais se me afigura um verdadeiro eco-museu! Porque agrega todas as funções que julgo serem as certas para se poder dizer que o é, ao contrário de muitos outros que, sendo embora muito bons repositórios de memória, acabam por ser aquilo que uma vez designei por “salas com esqueletos pendurados da parede”, já sem vida, e que apenas apontam para o passado e para uma quase mórbida atitude de pena e lamento.
Esta casa, aquela onde se celebra, em cada ano, a festa do vinho e da vinha dos Biscoitos, é um eco-museu porque:
Primeiro, tem um espaço de memória, sem ser demasiado grande ou demasiado pequeno, que recolhe os testemunhos e apresenta uma narrativa. Poderia ter uma variedade imensa de outras formas de expor mas, na sua simplicidade e organização, deixa clara a mensagem, e incluo aqui a zona do campo ampelográfico e de mostra das curraletas; 
Depois, tem relação efectiva com um território vivo e produz vinho! E isso liga toda a memória passada com a prática quotidiana de agora e com o futuro. Trata-se, portanto, não de um lugar onde se choram tempos já acabados, mas onde se sente a vida de agora, com as suas qualidades, dificuldades e anseios.
Falta, então o quê?
Se existe território, se existe memória, se existe presente de cultivo, se existe uma - enorme, por comparação com a actualidade - possibilidade de ampliação, embora ainda estejamos na penumbra, no que respeita a vinho - e já agora fruta - a sério, em quantidade e qualidade, dos Biscoitos, o único caminho que podemos propor é o da consolidação do que está feito, do adequado planeamento do território para que vinha e habitação saibam onde cada uma pode estar e, principalmente, há que chamar a terreiro todas as forças políticas e entidades com responsabilidade administrativa para que, descendo ao terreno, ajudem a construir um futuro que, tanto quanto vejo, é muito mais risonho aqui do que em muitas outras freguesias da ilha, da região e do País.
Porque é indiscutível que existe lugar para a vinha e o vinho que hoje, mais uma vez, comemoramos.
Saibamos querer!

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