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Uma necessidade premente
Classificação como Paisagem Protegida da área de vinhas dos Biscoitos
Por: Fernando Santos Pessoa*
É na qualidade de confrade da Confraria do Vinho Verdelho dos Biscoitos que venho corresponder ao solicitado por Jácome de Bruges Bettencourt, Amigo de longa data, actual grão-mestre da C.V.V.B. para emitir o meu parecer sobre fundamentos jurídicos que possam conduzir à classificação da área das vinhas na freguesia dos Biscoitos.
Desde há muito anos que faço parte do grupo interessado que se bate pela protecção daquela área agrícola de valor cultural, onde as curraletas constituem, desde o séc. XV, um verdadeiro monumento erigido pelos primeiros povoadores numa fajã de excelentes condições para a produção de vinho de qualidade.
Ao longo dos séculos a paisagem das vinhas dos biscoitos nunca mudou de funções: criada para produzir vinho verdelho, essa tem sido a sua função através de laboriosa e quase heróica construção e manutenção das curraletas abrindo na rocha os locais de plantação dos pés da vinha e dando assim origem ao famoso vinho Verdelho dos Biscoitos, denominação de origem que em tempos idos já teve honras dos melhores mercados europeus e que continua, apesar de muitas vicissitudes, a ser um produto de alta qualidade e muito prestigio.
A intenção de ter a área das vinhas protegida por uma classificação de carácter ambiental e cultural é aspiração perfeitamente compreensível e razoável, e muito antes da classificação, aliás justificadíssima, das vinhas da Ilha do Pico, já a questão dos Biscoitos estava a ser objecto de diligencias.
Confesso que, para mim, é uma estranha surpresa constatar a falta de empenho dos terceirenses na defesa de um valor cultural e paisagístico tão relevante; ao longo dos últimos anos os interesses da construção de moradias numa área única da paisagem terceirense, têm tido mais importância e até apoio do que a protecção das vinhas.
Ora toda a gente sabe que as casas podem ser construídas em qualquer lugar ao longo da costa – não faltam belos trechos de costa na Ilha – enquanto o verdelho, se as curraletas forem destruídas ou prejudicadas, não se vai produzir em mais lado nenhum.
Há assim valores paisagísticos, históricos e culturais, além de valor económico como produto de qualidade, que, justificam um estatuto de protecção para área das vinhas.
Para situações desta natureza é que se instituiu em Portugal a figura de “Paisagem Protegida”, que foi adaptada do alemão “Schutz lanschaft” – áreas protegidas, para defesa de valores paisagísticos e culturais relevantes.
Se fosse uma área de interesse natural poderia vir a ser Monumento Natural ou até uma Reserva Natural.
Na legislação regional sobre esta matéria – Decreto Legislativo Regional nº 21/93/A de 23-12-93, que adaptou para a região o estipulado no Decreto-Lei nº 19/93 de 23 de Janeiro – existe a figura de paisagem protegida de interesse regional (que não existe na lei nacional), mas existe também a Área protegida de interesse local, cujo artigo (artº 7º) diz:
“Na Região Autónoma dos Açores as áreas protegidas a que respeita o presente artigo classificam-se em paisagem protegida de interesse local nos termos do nº2 do artigo 5º, e de acordo com o interesse que procuram salvaguardar, sendo geridas pelas respectivas autarquias ou associações de municípios”
Por sua vez o citado nº2 do artigo 5º diz:
“As áreas referidas no número anterior são delimitadas e classificadas por decreto legislativo regional por iniciativa da secretaria Regional de turismo e ambiente ou no seguimento de propostas a esta apresentadas, por autarquias locais ou associações de municípios ou de defesa do ambiente”. (O sublinhado é nosso).
Portanto se as autoridades locais estiverem interessadas na classificação da área das vinhas, sabem que têm fundamento jurídico para propor essa classificação – classificação que descansava de vez as preocupações constantes sobre a sobrevivência das vinhas e que, por outro lado, podia potenciar a obtenção de algum financiamento para a gestão e manutenção da aérea.
Mas deixe-me dizer francamente o que penso – e outras vozes mais autorizadas do que a minha o corroboram – que a área tem valor paisagístico, histórico e cultural mais do que suficiente para poder merecer interesse do Governo Regional e ser-lhe atribuída condição de Paisagem Protegida de Interesse Regional.
Neste caso também competirá à Autarquia, se quiser defender com garra os interesses do seu concelho, propor essa classificação à Secretaria Regional.
Mas no mínimo, para a classificação de interesse local, não é compreensível a falta de vontade até agora existente.
O facto de o PDM vir a dar protecção à zona, não lhe confere o mesmo realce de natureza institucional que terá a sua classificação específica como Área Protegida.
Claro que a possível instituição do Ecomuseu dos Biscoitos, que aliás eu próprio propus num colóquio internacional de Museologia, aqui há alguns anos, e e sobre o qual já houve recentemente uma reunião promovida pela DRA, vem dar ênfase ao valor cultural do sítio, mas não lhe confere qualquer grau especifico de protecção.
Quero manifestar à Confraria a que tenho a honra de pertencer, que pelo menos através deste organismo enófilo que deverá ser motivo de orgulho para a Ilha Terceira, devemos continuar a batalhar para que as Autoridades venham finalmente a aceitar a importância que teria a instituição da Paisagem Protegida dos Biscoitos.
A Autarquia que assuma a defesa da área, primeiro como nível regional e se por aqui não encontrar aceitação, no mínimo como de nível local.
* Arquitecto Paisagista e Eng.º Agrónomo
Prof. da Universidade do Algarve
In A União de 21 de Julho de 2006
Outros :
Planta da Freguesia dos Biscoitos (ano 1830) aqui
Plantas Vasculares nas Vinhas dos Biscoitos (ano 1971) aqui.
"A vinha perde-se e a população nada ganha" (ano 1994) aqui.
"Região de Biscoitos, nos Açores - Casas em vez de vinhas" - Santos Mota (ano 1994) - aqui.
"Biscoitos: que futuro? "-José Aurélio Almeida (ano 1996) - aqui.
"As Vinha dos Biscoitos" -Bailinho de Carnaval da Freguesia das Fontinhas. (ano 1997) aqui.
"Uma virada nos Biscoitos"(Açores)- (ano 1998) aqui.
O viticultor açoriano está envelhecido (ano 1998/99) aqui
“Provedor de Justiça dá razão à Confraria” (ano 1999) aqui.
“Museologia de Interpretação da Paisagem Ecomuseu dos Biscoitos, da ilha Terceira” - por Fernando Santos Pessoa (ano de 2001) aqui.
"Carta de risco geológico da Terceira" (ano ano 2001) aqui.
"Paisagem Báquica - Memória e Identidade" - Aurora Carapinha (ano 2001) aqui.
“A Paisagem Açoriana dos Biscoitos” - por Gonçalo Ribeiro Telles (ano 2002) aqui.
“A Vinha, o Vinho dos Biscoitos e o Turismo” - por Margarida Pessoa Pires (ano 2009) aqui.
(continua)
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