Por: Santos Mota
“Criada em Janeiro deste ano, a zona vitivinícola dos Biscoitos, na ilha Terceira (Açores), encontra-se já ameaçada pelo urbanismo desenfreado, que em regra nada poupa para favorecer, muitas vezes sem respeito pelo ambiente, a especulação imobiliária.”
Os vinhos com nome “Biscoitos” integram-se na categoria comunitária dos vinhos licorosos de qualidade produzidos em região determinada (VLQPRD) e podem assumir, no futuro, assinalável importância económica, quer como produto local, quer indirectamente por as regiões onde são cultivadas as vinhas constituírem pólos de atracção turística.
É significativa a tipicidade dos métodos culturais empregues, que se coadunam com o interesse que a existência de uma zona vitivinícola sempre desperta, inserida em solos formados sobre substrato consolidado de basalto e rochas afins, andesitos e traquitos, em geral correspondentes a lavas recentes.
Apesar das vantagens de toda a ordem que a zona vitivinícola representa nas ilhas açorinas, há já pressões e cobiça sobre terrenos que se encontram em estado de semi-abandono, para construir nos Biscoitos habitações secundarias, dada a proximidade das zonas balneares que lá existem e do uso tradicional daquela freguesia como estância de veraneio das gentes de Angra do Heroísmo.
O alerta foi lançado na edição de 12 de Junho do “Diário Insular”, de Angra do Heroísmo, num artigo de J. G. Meneses que tem por título “Projecto para os Biscoitos beneficia apenas especulação” e como antetítulo “A Vinha perde-se e a população nada ganha”.
Diz-se em certo passo que “o resultado de tais pressões urbanísticas tem sido a crescente dispersão de habitação secundária no interior das zonas de vinhas e o aparecimento de um plano destinado a “ordenar” aquele espaço.
Contudo, o referido plano, já antigo e feito numa altura em que a sensibilidade pelos problemas ambientais e o interesse pela vinha eram muito pequenos, correspondia a um simples lotear quase total da área abaixo do Caminho do Concelho.
Após protestos vários e a intervenção da Confraria do Vinho Verdelho dos Biscoitos, o referido plano foi alterado pela Câmara Municipal da Praia da Vitória e reduzido o seu âmbito. Contudo, mesmo na sua versão mais recente, a sua execução corresponde ao quase certo fim da cultura da vinha em mais de metade da área regulamentada pelo Dec-Lei nº17/94. A abertura de caminhos proposta (particularmente o prolongamento da canada do Caldeiro em direcção ao mar) vai criar novas frentes de expansão urbana e abrir à especulação imobiliária novos terrenos.
Se o projecto avançar, as pressões no sentido da urbanização serão tais que muito em breve a consolidação da malha urbana a criar conduzirá a uma situação que em pouco diferirá do projecto inicial e significará o fim certo da cultura da vinha nos terrenos mais adequados para a vitivinicultura que existem na ilha Terceira.”
E o articulista conclui: “Lugar para construir casas há muito, mesmo na freguesia dos Biscoitos fora da área delimitada para a vinha, mas para produzir VLQPRD “Biscoitos” há apenas aquela pequena zona. Daí não ser de admitir a abertura de quaisquer novas vias na zona abaixo do Caminho do Concelho, devendo toda aquela zona ser transformada em área estritamente reservada ao cultivo da vinha. Sem excepções nem cedências a pressões. Senão todos perdemos algo que não poderá jamais ser recuperado”.
In Revista de Vinhos nº 58 – Setembro 1994
Outros relacionados com a paisagem vitícola dos Biscoitos:
Planta da Freguesia dos Biscoitos (ano 1830) aqui
Plantas Vasculares nas Vinhas dos Biscoitos (ano 1971) aqui.
"A vinha perde-se e a população nada ganha" (ano 1994) aqui.
"As Vinha dos Biscoitos" -Bailinho de Carnaval da Freguesia das Fontinhas. (ano 1997) aqui.
O viticultor açoriano está envelhecido (ano 1998/99) aqui
“Provedor de Justiça dá razão à Confraria” (ano 1999) aqui.
“Museologia de Interpretação da Paisagem Ecomuseu dos Biscoitos, da ilha Terceira” - por Fernando Santos Pessoa (ano de 2001) aqui.
"Carta de risco geológico da Terceira" (ano ano 2001) aqui.
"Paisagem Báquica - Memória e Identidade" - Aurora Carapinha (ano 2001) aqui.
“A Paisagem Açoriana dos Biscoitos” - por Gonçalo Ribeiro Telles (ano 2002) aqui.
"Rememorando as origens dos Biscoitos nos séculos XV e XVI"- por Rute Dias Gregório (ano 2008) aqui, aqui e aqui.
“A Vinha, o Vinho dos Biscoitos e o Turismo” - por Margarida Pessoa Pires (ano 2009) aqui.
(continua)
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