sábado, 15 de maio de 2010

Património Cultural - IDENTIDADES


Victor Cardoso*

* Investigador

MOINHOS UMA HERANÇA A RESGATAR [1]

I CONTEXTO HISTÓRICO

Nesta apresentação, que quero partilhar um pouco com vós, relacionada com esta temática dos moinhos, não foi preocupação central, dissertar sobre a ocupação primeira no Território, embora deva o dizer, ser essa área que mereça estudo – recorrendo-se às fontes que nos foram deixadas pelos primeiros cronistas – documentos fundamentais para a sua global compreensão e que encontram hoje novos desenvolvimentos e nos domínios das ciência e área do saber aplicado, com técnicas apuradas de diagnóstico, que nos levarão por certo, à obtenção de resultados com consistente exactidão e maior base de fundamentação. Importará assim [por exemplo] saber-se em que locais da ilha foram construídos os primeiros moinhos, nas suas diversas tipologias: os de água, primeiro, seguindo-se as atafonas e concluindo-se com os de vento [!?].

Alguns cronistas parecem querer sugerir apontando o território que hoje ocupa a Vila de São Sebastião - no seu arrabalde, como terra das primeiras azenhas, no entanto, opino, que não nos devemos descentrar da povoação de Angra, das suas características naturais – da notável Ribeira dos Moinhos, por um lado – a sul e na banda norte da ilha, os lugares de Quatro Ribeiras e Ribeira da Agualva, que nos podem indicar outros caminhos.

Devemos assim perceber, que os primeiros povoadores possuíam basta sensibilidade, nomeadamente Álvaro Martins Homem, que o confirmam como Homem de rasgados horizontes e de superior conhecimento na época, recordando-se que a ele se fica a dever a construção dos primeiros moinhos de água na Ribeira dos Moinhos, naquele que foi, seguramente, o mais importante curso de água na ilha e onde se achou construir as primeiras moendas, edificando-se abaixo da “Nascença de Água” (Nasce Água) - 12 como nos dão conta as fontes e nos foi deixado cartografado em “1589” na valiosa “Carta de Linschoten”, desenhada com rigor e ainda hoje bastante actual, podendo-se ver o traçado rectilíneo das ruas de Angra e na informação reservada à ribeira com identificação minuciosa dos moinhos.

Quanto à zona norte e à baía das Quatro Ribeiras: “A costa brava desta freiguesia será de uma légua em comprido, com uma baía, junto da qual estão três moinhos.../... muito fresca de águas, por ter quatro ribeiras de água fresca e fria, das quais três continuamente a correr”, citando Frutuoso, que, para os que não saibam, vós alunos, foi o nosso primeiro grande cronista, deixando-nos o valioso manuscrito das “Saudades da Terra” – uma obra em seis livros, escritos no século XVI.

E porque não recordar também Francisco Ferreira Drumond, ilustre e notável terceirense, sebastianense de nascimento, um açoriano, impar na época, isto porque até hoje não encontramos na nossa literatura, uma obra capaz de rivalizar no género com “Os Anais da Ilha Terceira”, Drumond escreveu: “São os três moinhos, que ali fez o capitão Álvaro Martins Homem com grande custo e dificuldade, assentados sobre a rocha, onde começa uma grossa muralha” . Importa dar-vos conta e noticia, que essa muralha, ainda hoje está lá, sobrevivendo à erosão do tempo e aos cataclismos que de volta e meia nos apoquentam na ilha e onde as gerações tem vindo sistematicamente a alhear-se de tão notável património.

Com estes dois (2) exemplos, citando as fontes, apenas se pretendeu dar conta da importância que os sistemas de moagem tinham efectivamente para os povos nas suas demandas de conquistar e de povoar novas terras. Angra foi um caso de sucesso nesse período - nomeadamente no apoio às rotas das naus que demandavam do sul, vindos das Índias a caminho da Europa – por força das correntes e ventos alísios, ou rumando ao Brasil - para descanso de tripulações, acudir aos doentes e seu reabastecimento - como sejam os exemplos na estada de Vasco e Paulo da Gama (este ultimo terá falecido na ilha e sido sepultado, embora ainda não se tenha conseguido localizar a sepultura) – após descoberta do Caminho por mar para a Índia e do holandês Linschoten – que arribou à ilha em consequência do encalhe, nesta costa, da nau onde viajava.
Essa avaliação terá tido o próprio Capitão, quando aqui aportou e presenciou o abundante caudal de águas que continuamente desaguavam na Baía e cercanias e que tinha a seu desfrute ali tão perto - uma zona privilegiada, porque também abrigada. Elementos que devem ter pesado na sua avaliação, para iniciar ali a construção da nova povoação.


VC
30/04/2010
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(continua)

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