terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Nunca digas nunca...

O progresso tem vindo a modificar as condições climáticas e a reduzir as pequenas planícies dos Açores.
Na ilha Terceira, por exemplo, o Ramo Grande, considerado "o celeiro da Ilha" cedeu, no final da colheita de 1944, o trigo aos aviões.


Campo das Lajes cantado por Vitorino Nemésio:

A moda da gasolina
Secou o trigo do chão;
Fez das Lajes um terreiro,
Oh que dor de coração!

Ó avião da carreira,
Carregadinho de bombas,
Tu foste a nossa desgrácia
E o espantalho das pombas!

- Oivi uma chocalhada,
Di noite, em riba das telhas;
Mas não era caçoada,
Reses, cabras nem ovelhas.

Eram quinhentos queimados
Voando por trás da serra,
dando nicões de aço fino,
Traques de fogo de guerra!

Tanto caga-fogo de alto!
tanto bidom, tanto prigo!
cimento não dá pão alvo
como dava o nosso trigo.


No Festa Redonda. Vitorino Nemésio-
Cantigas ao Campo das Lajes,
páginas 103 a 106.


Percebe-se. Eram os terrenos mais apropriados à construção do grande Aeroporto das Lajes e um aeroporto é indispensável numa ilha. Agora, ali mesmo, muito perto, (até porque na Terceira tudo fica perto...) estão a comer muitos terrenos à terra no alargamento de uma auto-estrada. Será mesmo indispensável?
Que as espécies marinhas ainda existentes nas costas das ilhas outrora tão abundantes e variadas não se extinguem por completo...Já vai faltando na terra e no mar a abundância que a Natureza controlava e oferecia.
Perante "os dilúvios" do actual milénio não terá chegado a hora de pensar numa nova "Arca de Noé"?
Produzir trigo? P'ra quê? É importar.
Produzir batatas? P'ra quê? Já não se tira semente...É importar.
Produzir leite? P'ra quê? É importar... nem que seja em pó.
Produzir vinho? P'ra quê? É importar... nem que seja mosto concentrado.
Água? Água! P'ra quê? Embora haja alguma... nos poços, bastante salgada, é importar em garrafas ou garrafões plásticos...
Carne... é importar...
Peixe? É importar!...
Cultivar Beterraba? P'ra quê? É importar ... açúcar...
Cultivar ananases? P'ra quê? É importar abacaxis.
Mão- de- obra? Que importa? É importar subsídios... para não produzir?...

Perante o que nos narra o "Almanaque Açores" de 1912, "nunca digas nunca" a cultivar os Açores!
«Todas as plantas tem os seus antecessores no estado selvagem, mas dos quais se deriva a raça, com as numerosas ramificações. A maior parte dos legumes e árvores de fruto procede da Pérsia, onde existem ainda representantes espontâneos. Todas as batatas provem de tubérculo americano " Solanum Commersonu", do qual conseguiu extrair um certo número de variedades muito interessantes um engenhoso agricultor do Poiton.
A videira cresce espontâneamente, ao que parece nas altas planícies da Ásia Central.
O trigo também deve ter o seu berço nas altas planícies asiáticas, que foram o berço da humanidade.
Um engenheiro-agrónomo fazendo uma viagem através da Alta Galileia, diz ter encontrado um trigo silvestre que deve ser o progenitor do nosso trigo moderno.
O trigo bravo, que cobre, às vezes, campos extensos, é um planta cujos grãos medem onze milímetros de comprimento, termo médio, e cujas propriedades nutritivas nada tem que invejar às dos cereais domésticos. Por último, esta é a consideração mais interessante, o trigo silvestre, cuja origem remonta aos tempos da Génesis, resiste admiravelmente a todos os climas, não teme o sol nem as geadas, e adapta-se facilmente aos terrenos mais áridos e rochosos.»

Joaquim Barbosa

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