segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Os Biscoitos: história e origem (1482-1556)


Por: Rute Dias Gregório*


















Escudo de Pero Anes do Canto


A expressão pouaraçom dos bysquytos do porto da cruz que he de pero anes do qaumto, inserta em escritura de 23 de Fevereiro de 1523, constitui a mais antiga, e conhecida, referencia explicita ao lugar dos Biscoitos.

A partir do mesmo texto, outros dois elementos ressaltam: a designação toponímica “Porto da Cruz” e a identidade do senhor do lugar, Pero Anes do canto, o primeiro provedor das armadas da ilha Terceira.

A ligação da figura ao espaço acontece em 1505, quando, conjuntamente com o vigário de Agualva e Quatro Ribeiras, Luís Eanes, adquire aí uma extensa área de terra a Pero Álvares. Este último á dado nalguns documentos como “do porto judeu”, mas também das Quatro Ribeiras ou morador além das Quatro Ribeiras. Seria Pero Álvares, muito provavelmente, aquele que Frutuoso alcunha de “Má Terramenta”, primeiro possuidor da dita terra e a quem o futuro provedor das armadas a comprara, apesar se ser sabido que os realmente primeiros proprietários foram João e Pero Afonso das Cunhas, e data de 1482.

De qualquer modo, é Pero Álvares, sem dúvida, o mais antigo personagem actuante na área. A sua carta de sesmaria, de 1486, dá-o por primeiro abytador que se lla foi morar sendo tudo ermo”, a quem coubera a feitura de “huns camjnhos e seruentyas(…) per onde sse agora serue este pouo.

Desconhecem-se os efectivos da ocupação então implicados. Somente se pode avançar que a carta de 1486 já refere a “casa da salga” (não arbitrária a existência na terra, hoje, de uma Canada da Salga) e provavelmente existiriam, pelo menos, os fundamentos daquilo que a escritura de venda (1505) designa como casas, graneis, pomares e benfeitorias.

Quanto ao topónimo Porto da Cruz apenas surge no dito documento de aquisição por Pero Anes do Canto. Até aí, a localização da terra remete-nos para biscoitos, mar, serra e fajãs. Não fora mesmo a referencia explicita a esta terra e encadeamento das múltiplas subsequentes por Pero Anes do Canto, e teríamos muitas dificuldades em situar claramente, aqui, a dada de Pero Álvares.

Biscoitos. Porto da Cruz: o porto que definiu a toponímia do Lugar. A partir dele Pero Anes do Canto escoava rendas e produções. (abastecimento das frotas das Índias)


Felizmente tal questão foi ultrapassada. Às referências ambíguas, dos primeiros tempos, sucedeu o topónimo “Porto da Cruz”. Este passou a ser, de 1505 em diante, referência fundamental da zona. Aliás, data mesmo do ano seguinte o registo de “loguo que se chama o porto da cruz”, a atestar o primeiro núcleo de povoamento.

Mas “Porto da cruz” é uma designação que na altura tanto pode surgir “só” como associada a “Fajã”. Aliás, desde 1505 se define aquilo que é dado como “fajãs” em 1488, Assim, aparece na documentação da Fajã do Porto da casa da Salga. Ou seja, as áreas junto ao actual porto dos Biscoitos e Canada da salga constituíram a Fajã da Casa da Salga. Aquelas que compunham o antigo porto dos futuros Biscoitos seriam a Fajã do Porto da Cruz.

Não obstante, e apesar dos dados de povoamento até agora referidos, desde a individualização toponímica à existência do lugar do Porto da Cruz, a verdade é que numa acordo entre partes de 1511, feito nas cazas da faim do djto Pedro Annes do Canto, se regista: onde este fizemos era onde não auia outra caza nem pouoração senão a do dito Pedro annes nem menos auia tabaliioão a menos de Pero Álvares e pelo menos até o período em causa, aqui o povoamento seria bastante incipiente.

(continua)

* Departamento de História, Filosofia e Ciências Sociais da Universidade dos Açores (Ponta Delgada).

Sem comentários: