terça-feira, 4 de janeiro de 2011

II – Os Biscoitos: história e origem (1482-1556)

(o anterior aqui)

Por: Rute Dias Gregório*

Porto da Salga, na fajã do mesmo nome, visto do Canto do Feno, no Caminho da Rocha do Mar que termina, no cruzamento, à Canada da Salga. Não se sabe bem onde, mas a partir daqui, mais propriamente dos “Biscoitos da Casa da Salga”, divididos entre os dois terratenentes da zona, ficaria a área de domínio de Gonçalo Álvares Pamplona.


É a Pero Anes do Canto, então, que caberá o impulso decisivo no arroteamento aproveitamento económico da zona, e inerente processo de ocupação humana. Começara logo por altura da aquisição, mandando “huns seus homens apoueytar as ditas terras”, aos quais se pagavam soldadas. Em 1512 o senhorio fazia um amplo arrendamento da dita terra a Jorge Marque e Afonso Anes. Por contratatos, de 1513 a 1515, sabemos que os tomadores da terra continuam obrigados a roçar o lugar, e as escrituras de aforamento, de 1523 a 1542, prescrevem as mesmas estratégias de aproveitamento e humanização do espaço, determinando ainda uma delas (de 1526), explicitamente, a construção de “casa de morada e pouoada”.

Constitui-se, assim, a designada quinta de S. Pedro. Aliás, a que começara por ser chamada “mjnha terra do porto da cruz”, ou da fajã do mesmo nome, de forma exclusiva até 1517, vai passar também a registar-se como “de S. Pedro”.

Em 1543 havia-se operado definitivamente a mudança toponímica, já que pelo menos a partir daí não mais vemos invocar-se o termo Porto da Cruz ou Fajã do Porto da Cruz. E assim como a terra e quinta passaram a ser de S. Pedro, o mesmo acontecera muito provavelmente á povoação que se fora constituindo no seu seio. Para mais, em adenda (1554) ao testamento do senhor da terra, prometia-se a construção de uma igreja na área, de invocação ao dito apostolo, junto de certas casas novas e onde se encontrava um monte de pedra para o efeito. Deste modo, aquela que viria a ser a paroquial dos Biscoitos, na segunda metade do século XVI, será erigida a mando do dito senhor e tomará o nome que já se dava à terra. Até então, o templo que servira os fregueses fora a ermida de Nossa Senhora da Nazaré, como designa o testamento do provedor, junto às suas casas, e que hoje, já como no tempo de Frutuoso, se chama Nossa Senhora do Loreto. A nova igreja, mais próxima dos ditos fregueses, impõe Pero Enes do Canto que “Seia mjar que a de sima (Nossa senhora da Nazaré)”. Confirmará, tal determinação, o impulso populacional do lugar.

Ermida de Nossa Senhora do Loreto (após o sismo de 1980)

Neste esforço, patenteavam-se muitas dificuldades e recursos, e por vezes falta destes últimos, a justificarem inúmeras mercês régias ao perpetrador da acção.

Para além disso, toda a tarefa não deixou igualmente se ser dificultada por demasiadas oposições e conflitos com os proprietários das terras confrontantes. Um deles, e significativo para a história dos biscoitos, foi o que aconteceu entre Pero Anes do Canto e Gonçalo Álvares Pamplona. Afinal, era este último senhor da única parte (mais pequena) dos Biscoitos que não cabia a Pero Enes do Canto (como o próprio Frutuoso confirma), aquela que a documentação diz começar no Biscoito da Casa da Salga. Aliás, terá sido este, ou parte dele, a motivar o pleito. A solução surgiu no repartir da área em conflito pelos dois terratenentes.

* Departamento de História, Filosofia e Ciências Sociais da Universidade dos Açores (Ponta Delgada).


(continua)



Sem comentários: