A freguesia dos Biscoitos, situada a Norte da ilha Terceira, “esteve em risco de ser incendiada” no ano de 1761 aquando da erupção vulcânica do Mistério Velho.
Nunes, J. C. 2000. Estudo geológico da depressão vulcânica de são Sebastião (ilha Terceira, Açores) e a área envolvente. Relatório Projecto PPERCAS – Universidade dos Açores 1/2000, Ponta Delgada. 25p.
«Começaram grandes terramotos em 22 de Novembro, e continuaram com muita frequência até 14 de Abril de 1761, em que a terra tremeu mais que nunca; e assim continuou com pequenos intervalos até ao dia 17 do mesmo mês, em que pela manhã arrebentou o fogo por detrás dos Picos gordos, com estrondos subterrâneos semelhantes a descargas de artilharia.
Veio logo por baixo do chão, arrojando a terra até o indicado sítio do Mistério Velho, e ali fez nova explosão em 21 de Abril, na distancia de uma légua do lugar dos Biscoitos, na ocasião, em que o povo ia em procissão com a coroa do Espírito Santo para o lugar do fogo. Esta segunda explosão durou oito dias, lançando ao ar com pavorosos estampidos pedras de extraordinária grandeza, e copiosos chuveiros de areia, que abrangeram quase toda a Ilha; junto ao fogo se formou um pico de mediana grandeza, todo composto de escórias vulcânicas, e ao redor deste outros montículos mais pequenos, compostos das mesmas matérias.
A freguesia dos Biscoitos ficou deserta; porque todos abandonaram as suas casas, levando consigo o que puderam, e os párocos mudaram o Santíssimo Sacramento para a Igreja das Quatro Ribeiras.
Esta mesma segunda explosão produziu três correntes de lava. A primeira, que terá 100 braças de comprido e 30 de largo, tomando a direcção do oriente, parou em um lugar denominado Chama, o qual ficou fumegando por alguns anos; a segunda, que terá 1.000 braças de comprido e 30 de largo, dirigiu-se para ocidente até uma Quinta, que hoje é do Conde de Subserra, donde lançou um língua para norte até onde se chama o Tamujal. Finalmente a terceira, e a maior ocorreu para norte, dividindo-se em duas, das quais uma foi parar ao sítio do Vimeiro, e a outra foi dar no sítio do Juncalinho, já mais branda; porém assim mesmo invadindo um arrabalde do lugar dos Biscoitos, destruiu 27 casas, e parou perto da Igreja da Freguesia, coisa de 500 braças longe do mar, tendo de comprido mais de uma légua, e em lugares 1.000 braças de largura.
Ninguém pereceu; porque todos tiveram tempo de se porem a salvo. A corrente das lavas era assaz tranquila de forma, que, segundo ouvi contar às pessoas daquele tempo, andando o povo em procissão ao dela acontecia acenderem nelas as tochas, quando se apagavam. Nos primeiros tempos a água das fontes daqueles sítios junto ao mar tinha um ardor como o da malagueta».
In José Acúrcio das Neves - «Entretenimentos Cosmológicos» - n.º 17.
Continua
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