Construções urbanas
Conveniência do seu facies regional; materiais de construção; sua salubridade.
Por: J. Soares de Lacerda.
Cada uma das ilhas dos Açores perdeu já aquele cunho típico que tanto caracterizou os nossos avós.
Essas habitações do passado nos Açores falavam-nos da vida dos seus moradores cuja divisa podia ser representada pela felicíssima frase dos latinos: divitae mercês sunt parcimoniae ac modestiae.
Eram umas habitações extremamente singelas, mas revelavam a economia, a modéstia e a actividade dos seus moradores. Sobre nós pesa um injusto labeu: indolentes.
Acaso é indolente um povo que em cinco séculos conseguiu transformar em terras de pão, em terras de amor e fartura o solo bravio destas nove pérolas açorianas?
Os nossos antepassados a par do seu árduo trabalho de arroteação, possuíam as grandes virtudes da economia e da modéstia: não bastava ganhar o dinheiro; cumpria sobretudo sabê-lo poupar.
O quadro de hoje é confrangedor e em especial na Ilha Terceira.
Modernizaram a casa e nela instalaram todas as comodidades imagináveis. Embelezaram-na momentaneamente por dentro e por fora, mas… à custa de que sacrifícios? (E sacrifícios incomportáveis pela paupérrima bolsa do seu possuidor!).
Fizeram dela uma casa de efémera duração, insalubérrima, prejudicial ao seu meio social, deslocada da vida do seu habitante.
A casa tem de ser uma continuação da vida do seu dono e tem de existir integrada no seu meio. Uma casa tem de representar um valor real da sociedade onde existe e não um valor negativo.
A despesa da sua construção deve enriquecer a sua região empregando materiais seus, mão-de-obra sua, Deve contribuir pelas condições arquitectónicas para a saúde do seus donos e deve ser duma conservação barata, por reduzidas serem as fontes de receita para a manutenção da família.
No passado, os nossos avós aspiraram a construir para legar as casas da família aos seus filhos, hoje, como o egoísmo domina, constrói-se para o próprio gozo. Pouco se importando saber se essa construção será duradoura ou efémera. Atende-se apenas ao momento presente.
A casa do passado tinha um lado prejudicial, a humidade resultante da má escolha da pedra empregada. Pedra muito porosa que desde os alicerces até ao alto, constituía uma inumerável tubagem de tiragem de água do solo, logo transformada em vapor pelo calor animal e pelo sol que dardejava sobre as suas faces exteriores. Esse vapor quente subia para representar a todo o momento uma função de êmbolo dentro dum corpo de bomba, desde que a casa surgia até que era destruída.
Os seus habitantes durante toda a vida estavam num permanente poço de humidade que se infiltrava no seu organismo arrasando-o com um sem número de achaques, predispondo-o para contrair muitas doenças e encurtando-lhe a longevidade, enquanto, onde as moradas são secas e saudáveis, como Pico e outras ilhas, os habitantes atingiam idades bonitas de 90 e 100 anos.
As construções modernas continuam o mesmo defeito: são porosas como as do passado.
As argamassas são ordinaríssimas e sem prêsa. Para alindar o seu exterior e para suprir a deficiência da mão d’ obra, recorre-se ao emprego do cimento que custa à economia do meio milhares de contos anuais sem representar uma vantagem.
As nossas ilhas são todas de origem vulcânica e sujeitas por isso a uma vibratilidade da sua crusta, sobre a qual, até a própria vaga marítima exerce uma pressão e oscilação.
Dessa oscilação e consequente vibração, as peças do cimento oscilam, fracturam-se, fendilham-se.
As nervuras internas de ferro, com grande afinidade pela humidade própria da região por virtude da corrente do golfo que nos banha de oeste para leste, postas assim a descoberto por essa imensa quantidade de fendilhamentos imperceptíveis vai-se lentamente transformando-se em ferrugem que por pouco tempo vem a atirar ao chão com a dispendiosa obra. Eis a ruína do meio pelo desastroso do processo. Não há uma única, de todas as obras construídas com o auxílio do cimento, em todos os Açores, que não acuse esta prova.
Como resolver a construção açoriana?
No Açores ano 1937
(Continua)
Conveniência do seu facies regional; materiais de construção; sua salubridade.
Por: J. Soares de Lacerda.
Cada uma das ilhas dos Açores perdeu já aquele cunho típico que tanto caracterizou os nossos avós.
Essas habitações do passado nos Açores falavam-nos da vida dos seus moradores cuja divisa podia ser representada pela felicíssima frase dos latinos: divitae mercês sunt parcimoniae ac modestiae.
Eram umas habitações extremamente singelas, mas revelavam a economia, a modéstia e a actividade dos seus moradores. Sobre nós pesa um injusto labeu: indolentes.
Acaso é indolente um povo que em cinco séculos conseguiu transformar em terras de pão, em terras de amor e fartura o solo bravio destas nove pérolas açorianas?
Os nossos antepassados a par do seu árduo trabalho de arroteação, possuíam as grandes virtudes da economia e da modéstia: não bastava ganhar o dinheiro; cumpria sobretudo sabê-lo poupar.
O quadro de hoje é confrangedor e em especial na Ilha Terceira.
Modernizaram a casa e nela instalaram todas as comodidades imagináveis. Embelezaram-na momentaneamente por dentro e por fora, mas… à custa de que sacrifícios? (E sacrifícios incomportáveis pela paupérrima bolsa do seu possuidor!).
Fizeram dela uma casa de efémera duração, insalubérrima, prejudicial ao seu meio social, deslocada da vida do seu habitante.
A casa tem de ser uma continuação da vida do seu dono e tem de existir integrada no seu meio. Uma casa tem de representar um valor real da sociedade onde existe e não um valor negativo.
A despesa da sua construção deve enriquecer a sua região empregando materiais seus, mão-de-obra sua, Deve contribuir pelas condições arquitectónicas para a saúde do seus donos e deve ser duma conservação barata, por reduzidas serem as fontes de receita para a manutenção da família.
No passado, os nossos avós aspiraram a construir para legar as casas da família aos seus filhos, hoje, como o egoísmo domina, constrói-se para o próprio gozo. Pouco se importando saber se essa construção será duradoura ou efémera. Atende-se apenas ao momento presente.
A casa do passado tinha um lado prejudicial, a humidade resultante da má escolha da pedra empregada. Pedra muito porosa que desde os alicerces até ao alto, constituía uma inumerável tubagem de tiragem de água do solo, logo transformada em vapor pelo calor animal e pelo sol que dardejava sobre as suas faces exteriores. Esse vapor quente subia para representar a todo o momento uma função de êmbolo dentro dum corpo de bomba, desde que a casa surgia até que era destruída.
Os seus habitantes durante toda a vida estavam num permanente poço de humidade que se infiltrava no seu organismo arrasando-o com um sem número de achaques, predispondo-o para contrair muitas doenças e encurtando-lhe a longevidade, enquanto, onde as moradas são secas e saudáveis, como Pico e outras ilhas, os habitantes atingiam idades bonitas de 90 e 100 anos.
As construções modernas continuam o mesmo defeito: são porosas como as do passado.
As argamassas são ordinaríssimas e sem prêsa. Para alindar o seu exterior e para suprir a deficiência da mão d’ obra, recorre-se ao emprego do cimento que custa à economia do meio milhares de contos anuais sem representar uma vantagem.
As nossas ilhas são todas de origem vulcânica e sujeitas por isso a uma vibratilidade da sua crusta, sobre a qual, até a própria vaga marítima exerce uma pressão e oscilação.
Dessa oscilação e consequente vibração, as peças do cimento oscilam, fracturam-se, fendilham-se.
As nervuras internas de ferro, com grande afinidade pela humidade própria da região por virtude da corrente do golfo que nos banha de oeste para leste, postas assim a descoberto por essa imensa quantidade de fendilhamentos imperceptíveis vai-se lentamente transformando-se em ferrugem que por pouco tempo vem a atirar ao chão com a dispendiosa obra. Eis a ruína do meio pelo desastroso do processo. Não há uma única, de todas as obras construídas com o auxílio do cimento, em todos os Açores, que não acuse esta prova.
Como resolver a construção açoriana?
No Açores ano 1937
(Continua)
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