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Por: Jack Masquelier
EFEITO NEUTRALIZANTE DO VINHO
Demonstrar um efeito neutralizante in vitro não apresenta dificuldade: alguns tubos bastam. O D.P.P.H. (dipénylpierylhydrazyl), radical livre estável e colorido convém a este teste. A sua solução no metanol, de um tom violeta intenso, perde a cor por adição de um neutralizante. O vinho tinto faz outro tanto e a espectrometria permite quantificar o fenómeno. É então o desaparecimento do radical livre que se encontra registado e posto em acção pela eficácia do neutralizante.
In vitr, tudo se complica. Como “fotografar” os R.L.O. durante a sua curta existência? Chega-se lá indirectamente, doseando certos produtos da sua actividade que, lá esses, vivem muito tempo. Assim, o ataque dos A.G.P.I. faz aparecer aldeídos perfeitamente avaliáveis: a sua taxa desce se o neutralizante agir. Uma tal investigação revela-nos que a maior parte das moléculas eficazes in vitro revelam-se inactivas sobre o ser vivo. Introduzidas na boca não passam para lá da barreira digestiva. Este efeito de biodisponibilidade é redibiditório: um neutralizante deve chegar ao local e a toda a parte em que os R.L.O. atacam.
Os O.P.C.do vinho possuem esta qualidade. LAVOLLAY tinha-a descoberto em 1944: a R.C. das usas cobaias, mediada sobre a pele, crescia uma hora após a ingestão de vinho tinto. Podemos achar estranho que tenha sido preciso combater tanto antes da admissão desta evidência. No homem, a ingestão de uma gélula de O.P.C., faz aparecer, 30 minutos mais tarde, na saliva, a reacção da cinidina especifico dos polifenóides intactos. A riqueza da saliva em prolina explica este fenómeno.
O teste ao ditranol confirma aeficácia dos O.P.C. do vinho. Este produto, muito diluído, provoca na pele uma reacção inflamatória muito severa, devido à produção de R.L.O. A reacção torna-se apenas perceptível sobre um zona cutânea pelos O.P.C.
O “FRENCH PARADOX”
“O álcool é um dos medicamentos mais eficazes que temos para reduzir a mortalidade coronária”. Esta ideia provocadora, lançada em 1991 na televisão americana por Sege RENAUD, provocou grande agitação. Retomada na obra de Lewis PERDUE um ano mais tarde, esteve na origem do “French Paradox”, uma campanha mediática em favor do vinho que se espalhou no mundo inteiro. O paradoxo era francês, porque, apesar do nível de factores de risco ser igual ao das nações desenvolvidas, a França apresentou a mortalidade coronária mais baixa. Tabaco, álcool, abuso de gorduras, hipertensão, colesterol, vida sedentária: os franceses parecem desdenhar desses inimigos do coração. E a sua mortalidade é mesmo pouco elevada, segundo as estatísticas recentes da O.M.S. Uma vês aceite que o vinho constitui a maior parte do álcool que eles consomem, a relação impõe-se: na curva que expressa a mortalidade por enfarte em 21 nações desenvolvidas que bebem vinho, a França é a melhor colocada, seguida de muito perto por Portugal. O humor de RENAUD foi amenizado com a afirmação: “Eu não imaginei logo que o consumo do vinho pudesse explicar a protecção observada”. Esta afirmação foi feita em 1995.
Numa palavra, o”French Paradox” responde a dois factores maiores: o consumo habitual de vinho e um regime alimentar de tipo mediterrânico. Por que motivo foi preciso esperar o inicio dos anos 90 para constatar e mediatizar ao extremo uma situação conhecida muito antes? Sem dúvida que era preciso que os resultados de numerosas investigações epidemiológicas lançadas desde há 20 anos atingissem a massa crítica e que a verdade fosse obrigada a impor-se.
Veja-se agora algumas etapas notáveis desse percurso. Em 197, TURNER propõe três hipóteses para ligar o consumo de álcool aos seus efeitos fisiológicos:
1. Nenhuma acção nociva, em todas as doses.
2. Efeito nulo com fraca dose e nocivo para além disso.
3. Efeito favorável e princípio e nocivo de seguida.
Para TURNER, a terceira eventualidade é a única aceitável. Ela verifica-se em patologia cardíaca, onde os benefícios de um consumo moderado levam vantagem sobre uma abstinência total. O efeito protector sobre a arteriosclerose coronária aumenta com a dose mas com 100 gramas por dia, o risco de hemorragia cerebral anula o benefício previsto.
Em 1979, STLEGER publica no Lancet o seu artigo tornado para sempre célebre. Confirmados os pontos de vista de TURNER, ele mostra que o efeito protector do álcool sobre a morte por enfarte existe na realidade, mas que atinge a sua plena significação epidemiológica sempre que o vinho está em causa. A tal ponto que, neste fenómeno, é preciso procurar algures o mecanismo na fase alcoólica do vinho. ST LEGER aconselha começar as investigações sobre os líquidos do sangue, sobre a agregação das plaquetas e sobre todo o constituinte sanguíneo que pode estar ligado à formação do eteroma. É preciso também ligar-se ao estudo dos efeitos preventivos ou curativos de um consumo moderado de vinho ou de álcool sobre o enfarte. Que pena que este distinto perito em epidemia tenha ignorado a existência dos O.P.C. É verdade que os britânicos são pouco enólogos.
Segundo os votos de ST LEGER, a década de 80 foi consagrada a conhecer melhor a patologia do ateroma. Tornou-se evidente que fenómenos de oxidação estavam implicados nele, em particular no circuito que permite purificar o sangue do seu excesso de colesterol. Normalmente, este esterol deixa a artéria graças aos H.D.L. encarregados de a limpar. Mas logo que os L.D.L. que o transportam da parede do vaso sofrem uma peroxidação, o esterol acumula-se nos glóbulos brancos, que ficam enormes e morrem logo, perto da futura lesão. Os H.D.L. partem sem produzir efeito. Graças aos O.P.C. o vinho tinto opõe-se a esta peroxidação e restabelece o circuito normal. Tudo acaba por se explicar: em 1961, eu tinha atribuído aos polifenóis do vinho o seu feito hipocolesterolmianto e agora o mecanismo molecular está à vista.
A agregação das plaquetas foi igualmente objecto de pesquisas aprofundadas, porque o risco de enfarte assenta em parte sobre ela. Útil no caso de hemorragia, torna-se, no entanto, perigosa por excesso, criando um obstáculo ao fluxo sanguíneo na artéria. Dois resultados se tiram destes trabalhos:
1. A agregação das plaquetas sucede à peroxidação dos ácidos gordos do plasma. O vinho tinto, uma vez mais, pode desempenhar um papel de travão ao seu antioxidante.
2. O álcool em dose moderada é um antigregante. Mas considerá-lo um salvador das coronárias +e sinal de ingenuidade. Porque algumas horas após a sua ingestão aparece o ressalto que inverte a sua acção e amplia a agregação. No caso de grande consumo, um conglomerado de plaquetas pode formar-se e obstruir a artéria. A paragem cardíaca ou a morte por apoplexia podem, pois suceder ao estado de embriaguez de um fim-de-semana seguida de ressaca.
Só existem duas respostas para tais contrariedades: um é embebedar-se de álcool sem parar, o que conduz à hemorragia cerebral; outro é beber vinho regularmente a cada refeição, sabendo que, mesmo a quando da ressaca, o vinho tinto, graças aos O.P.C., anula o efeito – ressalto do seu próprio álcool.
Continua
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